A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu de forma unânime, no último 5 de novembro, manter a condenação da Pernambucanas por exploração de trabalho análogo à escravidão na confecção de suas roupas em 2011, em um caso de terceirização irregular.
Na ocasião, 16 trabalhadores bolivianos - entre eles, dois adolescentes - foram resgatados em uma oficina na Zona Norte de São Paulo (SP) subcontratada por um fornecedor da Pernambucanas. Eles estavam submetidos a condições degradantes, jornada exaustiva e servidão por dívida.
Os cinco ministros da Primeira Turma reverteram uma decisão liminar (provisória) de junho de 2023 do ministro do STF Luís Roberto Barroso, que cassou as sentenças do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT2) contra a rede varejista.
Ele julgou uma Reclamação Constitucional com pedido de liminar da empresa, que alegava que as condenações judiciais contrariavam entendimento consagrado pelo próprio STF.
Em julgamentos anteriores, o tribunal determinou a constitucionalidade da terceirização da atividade-fim - ou seja, quando uma empresa contrata outra para executar a mesma atividade principal que realiza. Diante da decisão de Barroso, a Advocacia-Geral da União (AGU) entrou com recurso para a manutenção da condenação.
Em seu voto, o ministro Flávio Dino, membro da Primeira Turma do STF e relator da ação, deu razão ao argumento da AGU de que as sentenças que determinaram a condenação da rede varejista não violaram as decisões do STF. Segundo ele, a Justiça do Trabalho não decidiu "no sentido de ser inválida a terceirização de atividade-fim".
Portanto, de acordo com Dino, nenhum dos precedentes do STF relacionados à terceirização impede o reconhecimento do vínculo de emprego em casos específicos. "O vínculo empregatício não é compulsório, tampouco foi banido da ordem jurídica. Trata-se de análise específica, de lide com contornos próprios, e não de debate abstrato sobre tese jurídica", concluiu.
Em nota, a Pernambucanas afirma que não há "qualquer decisão definitiva em relação à matéria" e informa que, "exercendo seu direito constitucional ao contraditório, permanecerá lutando para que seja reconhecida a conformidade das suas operações com a lei e com os princípios morais e éticos aplicáveis, que sempre orientam sua conduta".
Costureiros trabalhavam para oficina subcontratada por fornecedor
Em março de 2011, auditores fiscais da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo (SRTE/SP) resgataram 16 trabalhadores bolivianos que eram explorados em condições de escravidão contemporânea na fabricação de roupas para as Pernambucanas. A operação foi acompanhada pela reportagem da Repórter Brasi.
A oficina estava localizada na zona norte de São Paulo (SP) e costurava peças para a intermediária Dorbyn Fashion Ltda, uma das fornecedoras da rede varejista, que já havia sido flagrada explorando trabalho escravo no ano anterior. No momento em que a fiscalização chegou ao local, o grupo confeccionava blusas da coleção outono-inverno da Argonaut, marca da empresa.
Entre as vítimas, havia dois adolescentes. A fiscalização constatou que os trabalhadores estavam submetidos a condições degradantes, jornada exaustiva de trabalho e servidão por dívida, três dos elementos que caracterizam o trabalho análogo ao de escravo segundo o artigo 149 do Código Penal.
Os resgatados trabalhavam mais de 60 horas semanais, sem o pagamento de horas-extras. Recebiam, em média, R$ 400 mensais, valor abaixo do salário mínimo estabelecido para 2011, de R$ 545. A inspeção recolheu anotações referentes a descontos irregulares, configurando a servidão por dívida.
O ambiente de trabalho apresentava riscos à saúde e segurança das vítimas. Não havia janelas ou qualquer tipo de ventilação, os alimentos eram armazenados de forma irregular e não havia a possibilidade de se tomar banho com água quente.
Em entrevista à Repórter Brasil na época, o auditor-fiscal Luís Alexandre Faria afirmou que a Pernambucanas não poderia alegar que apenas vendia as peças de vestuário que os trabalhadores resgatados confeccionavam.
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