Quase um século após a presidência do governante que por mais tempo permaneceu no cargo no Brasil, ainda há muito para conhecer e compreender daqueles tempos. Entre os tantos dissensos e contradições que acompanham a figura de Getúlio Vargas, há uma convergência: a influência para a história brasileira do político que saiu do interior do Rio Grande do Sul para o Palácio do Catete, da então capital Rio de Janeiro, tirando a própria vida quando ainda ocupava o principal posto da nação, em 24 de agosto de 1954.
O presidente que por mais tempo governou o país nascia há 140 anos, em 19 de abril de 1.882, na cidade de São Borja (cerca de 600 km de Porto Alegre). Sua trajetória combinou períodos de revolução, ditadura e eleição pelo voto direto para somar 19 anos no centro do poder, sintetizando em si a complexidade de uma sociedade cujos avanços e retrocessos muitas vezes caminham lado a lado.
"Pai dos pobres" e CLT Aclamado como "o pai dos pobres" por suas políticas sociais, em especial a criação da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), voltada ao operariado, ou acusado pelo "mar de lamas", devido a denúncias de corrupção, passando por movimentos como queremismo e tenentismo, o "retrato do velho", conforme cantava o jingle em sua vitoriosa campanha pelo voto popular em 1950, tem, se não muitas caras, várias facetas. "Podemos dividir a história do Brasil em AG e DG — antes e depois de Getúlio", escreve o jornalista Lira Neto, autor de uma trilogia sobre o ex-presidente. "O país era um e passou a ser outro com tudo de positivo e também de negativo durante esse processo de transformação da realidade nacional
Responsável por articular a derrubada da República do Café com Leite, quando somente mineiros e paulistas dominavam o cenário político, Vargas chega à presidência por meio da Revolução de 1930, no que seria um governo provisório, apoiado essencialmente por militares de baixa patente (tenentismo), após perder a eleição um ano antes. "Trabalhadores do Brasil" Reconduzido por uma assembleia constituinte quatro anos mais tarde, introduz reformas fundamentais no campo democrático, a exemplo do voto feminino e o sufrágio secreto, inaugurando uma nova forma de relação do presidente com o povo
"Ele mudou a forma como os presidentes e as autoridades lidavam com o público. Antes, os presidentes falavam 'meus senhores', e ele começou 'trabalhadores do Brasil', alterando a interlocução do chefe com a sociedade", comenta a cientista política Maria D'Araujo no documentário "Getúlio: a construção do mito". O progresso no terreno da participação popular, entretanto, seria rapidamente solapado por decisões que cassaram os partidos políticos, impuseram a censura, o fechamento do Congresso e a ameaça a adversários no período que ficaria conhecido como Estado Novo ou ditadura Vargas, entre 1937 e 1945, instituído sob o argumento de que o país estaria ameaçado por uma conspiração de de comunistas e judeus, o chamado Plano Cohen
"Vargas ascende ao poder num mundo dominado por ditaduras. Salazar em Portugal, Franco na Espanha, Mussolini na Itália, Hitler na Alemanha", relata o historiador Francisco Teixeira, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). "No Brasil, a repressão era real, sobretudo a partir da instituição da Lei de Segurança Nacional e do Tribunal de Segurança Nacional, por onde passaram mais de 30 mil pessoas, presas e torturadas sem nenhum direito à defesa. Era uma repressão de massa", afirma o pesquisador.
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